(Olavo Bilac)
Não quero o Zeus Capitolino
Hercúleo e belo,
Talhar no mármore divino
Com o camartelo.
Que outro - não eu! - a pedra corte
Para, brutal,
Erguer de Atene o altivo porte
Descomunal.
Mais que esse vulto extraordinário,
Que assombra a vista,
Seduz-me um leve relicário
De fino artista.
Invejo o ourives quando escrevo:
Imito o amor
Com que ele, em ouro, o alto relevo
Faz de uma flor.
Imito-o. E, pois, nem de Carrara
A pedra firo:
O alvo cristal, a pedra rara,
O ônix prefiro.
Por isso, corre, por servir-me,
Sobre o papel
A pena, como em prata firme
Corre o cinzel.
Corre; desenha, enfeita a imagem,
A ideia veste:
Cinge-lhe ao corpo a ampla roupagem
Azul-celeste.
Torce, aprimora, alteia, lima
A frase; e, enfim,
No verso de ouro engasta a rima,
Como um Rubim.
Quero que a estrofe cristalina,
Dobrada ao jeito
Do ourives, saia da oficina
Sem um defeito:
E que o lavor do verso, acaso,
Por tão subtil,
Possa o lavor lembrar de um vaso
De Becerril.
E horas sem conto passo, mudo,
O olhar atento,
A trabalhar, longe de tudo
O pensamento.
Porque o escrever - tanta perícia,
Tanta requer,
Que oficio tal... nem há notícia
De outro qualquer.
Assim procedo. Minha pena
Segue esta norma,
Por te servir, Deusa serena,
Serena Forma!
Deusa! A onda vil, que se avoluma
De um torvo mar,
Deixa-a crescer; e o lodo e a espuma
Deixa-a rolar!
Blasfemo> em grita surda e horrendo
Ímpeto, o bando
Venha dos bárbaros crescendo,
Vociferando...
Deixa-o: que venha e uivando passe
- Bando feroz!
Não se te mude a cor da face
E o tom da voz!
Olha-os somente, armada e pronta,
Radiante e bela:
E, ao braço o escudo> a raiva afronta
Dessa procela!
Este que à frente vem, e o todo
Possui minaz
De um vândalo ou de um visigodo,
Cruel e audaz;
Este, que, de entre os mais, o vulto
Ferrenho alteia,
E, em jato, expele o amargo insulto
Que te enlameia:
É em vão que as forças cansa, e â luta
Se atira; é em vão
Que brande no ar a maça bruta
A bruta mão.
Não morrerás, Deusa sublime!
Do trono egrégio
Assistirás intacta ao crime
Do sacrilégio.
E, se morreres por ventura,
Possa eu morrer
Contigo, e a mesma noite escura
Nos envolver!
Ah! ver por terra, profanada,
A ara partida
E a Arte imortal aos pés calcada,
Prostituída!...
Ver derribar do eterno sólio
O Belo, e o som
Ouvir da queda do Acropólio,
Do Partenon!...
Sem sacerdote, a Crença morta
Sentir, e o susto
Ver, e o extermínio, entrando a porta
Do templo augusto!...
Ver esta língua, que cultivo,
Sem ouropéis,
Mirrada ao hálito nocivo
Dos infiéis!...
Não! Morra tudo que me é caro,
Fique eu sozinho!
Que não encontre um só amparo
Em meu caminho!
Que a minha dor nem a um amigo
Inspire dó...
Mas, ah! que eu fique só contigo,
Contigo só!
Vive! que eu viverei servindo
Teu culto, e, obscuro,
Tuas custódias esculpindo
No ouro mais puro.
Celebrarei o teu oficio
No altar: porém,
Se inda é pequeno o sacrifício,
Morra eu também!
Caia eu também, sem esperança,
Porém tranquilo,
Inda, ao cair, vibrando a lança,
Em prol do Estilo!
Este poema talvez seja o que melhor retrata a época parnasiana pois nele percebemos toda a riqueza buscada pelo autor, tanto no texto quanto na forma.
Nas duas primeiras estrofes, Olavo Bilac deixa isso bem claro ao se comparar a um ouvires.
Na ourivesaria se fabrica peças de grande riqueza de detalhes.
Na nona estrofe ele diz:
Quero que a estrofe cristalina,
Dobrada ao jeito
Do ourives, saia da oficina
Sem um defeito.
Esta estrofe resume bem o parnasianismo pois nela conseguimos reconhecer tudo o que o poeta quer. Se olharmos bem vemos a metrificação sempre regular ea grande variedade de rimas ricas.
Aqui também percebemos que não há nenhuma preocupação com os dramas do cotidiano popular.
O autor simplesmente ignora tudo ao se redor e se rende somente a perfeição de seu poema, que descreve sua profissão tão querida, a escrita. (Torre de Marfim).
Grupo-Claudia,Raquel,Victor. 2002
Gente, perfeitinha a análise. Simples e objetiva - gostei.
ResponderExcluirTomem nota das observações para aprimorar nas próximas:
- Em "Esta estrofe resume bem o parnasianismo pois nela conseguimos", coloquem a vírgula antes do "pois". Devem fazer isso sempre que ele introduzir uma explicação, OK?
- Em "Se olharmos bem vemos a metrificação", coloquem vírgula depois de "bem", já que o período é iniciado com uma condição (a de olharmos bem). Ainda no mesmo período, vocÊs iniciaram com o futuro do subjuntivo (olharmos), mantenham o tempo no verbo seguinte (VER): Se olharmos bem, VEREMOS a metrificação.
- As palavras "(Torre de marfim)" ficaram soltas. POderiam escrever metaforicamente: "Trancam-se numa torre de marfim".
Nota: 1,7